terça-feira, 3 de abril de 2012

O jumentinho e a vaidade


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Dom Murilo S. R. Krieger
Arcebispo de São Salvador da Bahia / Primaz do Brasil
As celebrações da Igreja expressam sentimentos bem definidos. Algumas, como a do Natal e da Páscoa, são marcadas pela alegria. Outras, como a da Sexta-feira Santa e Finados, nos levam a uma profunda reflexão sobre o sofrimento. Já no dia de hoje – Domingo de Ramos – a celebração é única. Em nenhum outro dia do calendário da Igreja misturam-se sentimentos tão diferentes e até mesmo opostos.
A Liturgia – isto é, a oração oficial da Igreja – começa em clima de festa. Jesus é aclamado nas ruas de nossas cidades, é festejado como rei e saudado com ramos. Revive-se, assim, o que aconteceu em Jerusalém, onde ele entrou montado em um jumentinho. O evangelista Mateus dá pormenores da participação desse animal, naquela entrada triunfal: “Jesus enviou dois discípulos, dizendo-lhes: “Ide até o povoado ali na frente, e logo encontrareis uma jumenta amarrada e, com ela, um jumentinho. Desamarrai-os e trazei-os a mim! E se alguém vos disser alguma coisa, direis: ‘O Senhor precisa deles, mas logo os mandará de volta’” (Mt 21,1-2). À decisão de Jesus, de escolher um jumento para entrar em Jerusalém, precisamos dar uma atenção especial. Afinal, esse fato chegou a ser antecipado pelo profeta Zacarias, cerca de três séculos antes: “Dança de alegria, filha de Sião, dá vivas, filha de Jerusalém, pois agora o teu rei está chegando, justo e vitorioso. Ele é pobre, vem montado num jumento, num burrico, filhote de jumenta” (Zc 9,9).

Depois da bênção de ramos, quem dá o tom da celebração é o profeta Isaías. Ele, que viveu cerca de 700 anos antes de Cristo, antecipa os sofrimentos que Jesus enfrentará nos dias seguintes, e o faz com tintas tão fortes que se poderia pensar ser uma descrição de um cronista da época de Jesus: “Apresentei minhas costas aos que me batiam e meu rosto aos que me arrancavam a barba. Não escondi meu rosto diante as injúrias e cuspidas” (Is 50,6). Em seguida, é Paulo que nos apresenta o que significou, para Jesus, o fato de ter assumido nossa natureza humana: ele esvaziou-se, assumiu a condição de escravo, foi obediente até a morte, e morte de Cruz; por isso, foi exaltado pelo Pai (cf. Fl 2). A Palavra de Deus atinge seu ponto máximo com a descrição da paixão de Cristo (Mt 26).

Volto ao jumentinho. Por que Jesus o escolheu? Para entrar na cidade de Jerusalém, poderia ter escolhido uma vistosa carruagem, como faziam outros reis. Preferiu, contudo, o meio de transporte dos pobres. Ninguém deve ter percebido o jumentinho. Melhor: quase ninguém; as crianças, certamente, devem ter achado o máximo! A atenção dos adultos se voltou para Jesus. Ele é que importava; ele é que era o centro da festa.

A cena daquele dia, que passou a ser conhecido como “Domingo de Ramos”, me faz lembrar um fato, cuja descrição ouvi do próprio Dom Helder Câmara. O então Arcebispo de Recife estava nos Estados Unidos, participando de um Congresso Eucarístico. Constava do programa uma conferência que ele e Madre Teresa de Calcutá dariam em um grande estádio. Quando chegaram, a multidão, de pé, passou a aclamá-los. Então, Dom Helder se voltou para Madre Teresa e lhe perguntou, não sem certa ironia: “O que a senhora faz para que momentos assim não a deixem vaidosa?” Com simplicidade, ela lhe respondeu: “Muito simples: lembro-me do Domingo de Ramos e digo a Jesus: “Tu é que estás entrando aqui e sendo aclamado. Eu não passo do jumentinho que te carrega!”.

Muito sábia Madre Teresa, pois a vaidade é sempre ridícula. Quantas iniciativas ficam prejudicadas pelos egos inflamados! Quantas pessoas passam a se considerar melhores e mais importantes, por causa de elogios recebidos – elogios, diga-se de passagem, nem sempre sinceros! Tais pessoas melhor fariam se lessem ao menos o primeiro capítulo do Livro do Eclesiastes (250aC), que começa assim: “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade” (Ecl 1,1b). Em outras palavras: se alguma coisa conseguirmos com nossos trabalhos, decisões e iniciativas, digamos ao Senhor: “Senhor, sou apenas teu jumentinho. Que ninguém perca tempo prestando atenção em mim; que todos olhem para ti e te aclamem. Tu que és importante!”

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Reflexão

Todas as pessoas costumam falar em justiça ,mas para a maioria delas o fundamento dessa justiça são princípios e valores humanos, principalmente o que está escrito nas leis. Para nós cristãos, esse critério não é suficiente para entendermos verdadeiramente o que é justiça. Não é suficiente em primeiro lugar porque nem tudo o que é legal, é justo ou moral, como por exemplo a legalização do divórcio, do aborto ou da eutanásia. Também devemos levar em consideração que todas as pessoas, embora sejam seres naturais, possuem um dom de Deus que faz delas superiores à natureza, participantes da vida divina, e como Deus é amor, o amor é, para quem crê, o único e verdadeiro critério da justiça

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