Arcebispo de São Salvador da Bahia / Primaz do Brasil
Depois da bênção de ramos, quem dá o tom da celebração é o profeta Isaías. Ele, que viveu cerca de 700 anos antes de Cristo, antecipa os sofrimentos que Jesus enfrentará nos dias seguintes, e o faz com tintas tão fortes que se poderia pensar ser uma descrição de um cronista da época de Jesus: “Apresentei minhas costas aos que me batiam e meu rosto aos que me arrancavam a barba. Não escondi meu rosto diante as injúrias e cuspidas” (Is 50,6). Em seguida, é Paulo que nos apresenta o que significou, para Jesus, o fato de ter assumido nossa natureza humana: ele esvaziou-se, assumiu a condição de escravo, foi obediente até a morte, e morte de Cruz; por isso, foi exaltado pelo Pai (cf. Fl 2). A Palavra de Deus atinge seu ponto máximo com a descrição da paixão de Cristo (Mt 26).
Volto ao jumentinho. Por que Jesus o escolheu? Para entrar na cidade de Jerusalém, poderia ter escolhido uma vistosa carruagem, como faziam outros reis. Preferiu, contudo, o meio de transporte dos pobres. Ninguém deve ter percebido o jumentinho. Melhor: quase ninguém; as crianças, certamente, devem ter achado o máximo! A atenção dos adultos se voltou para Jesus. Ele é que importava; ele é que era o centro da festa.
A cena daquele dia, que passou a ser conhecido como “Domingo de Ramos”, me faz lembrar um fato, cuja descrição ouvi do próprio Dom Helder Câmara. O então Arcebispo de Recife estava nos Estados Unidos, participando de um Congresso Eucarístico. Constava do programa uma conferência que ele e Madre Teresa de Calcutá dariam em um grande estádio. Quando chegaram, a multidão, de pé, passou a aclamá-los. Então, Dom Helder se voltou para Madre Teresa e lhe perguntou, não sem certa ironia: “O que a senhora faz para que momentos assim não a deixem vaidosa?” Com simplicidade, ela lhe respondeu: “Muito simples: lembro-me do Domingo de Ramos e digo a Jesus: “Tu é que estás entrando aqui e sendo aclamado. Eu não passo do jumentinho que te carrega!”.
Muito sábia Madre Teresa, pois a vaidade é sempre ridícula. Quantas iniciativas ficam prejudicadas pelos egos inflamados! Quantas pessoas passam a se considerar melhores e mais importantes, por causa de elogios recebidos – elogios, diga-se de passagem, nem sempre sinceros! Tais pessoas melhor fariam se lessem ao menos o primeiro capítulo do Livro do Eclesiastes (250aC), que começa assim: “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade” (Ecl 1,1b). Em outras palavras: se alguma coisa conseguirmos com nossos trabalhos, decisões e iniciativas, digamos ao Senhor: “Senhor, sou apenas teu jumentinho. Que ninguém perca tempo prestando atenção em mim; que todos olhem para ti e te aclamem. Tu que és importante!”
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