Bispo auxiliar de Brasília (DF) e secretário geral da CNBB, Dom Leonardo Ulrich Steiner é um dos cinco padres sinodais brasileiros. Na tarde desta terça-feira, 23 de outubro, ele concedeu entrevista na qual faz um balanço dos trabalhos e projeta o final do encontro com seus reflexos para a Igreja no Brasil. Dom Leonardo atendeu a assessoria de imprensa da CNBB na Domus Sacerdotalis, em Roma, local onde está hospedado o grupo dos bispos brasileiros.
Dom Leonardo foi eleito na última assembleia dos bispos em Aparecida para representar o país neste importante acontecimento da Igreja juntamente com o cardeal arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, dom Geraldo Lyrio Rocha, arcebispo de Mariana (MG) e dom Sergio da Rocha, arcebispo de Brasília. Também participa do Sínodo, nomeado pelo Papa, dom Benedito Beni dos Santos, bispo de Lorena (SP).
Leia a entrevista.
Os bispos brasileiros formam um só grupo de trabalho no Sínodo ou estão engajados em grupos com bispos de outros países?
A primeira etapa do Sínodo foi realizada num grande plenário chamado de Aula Sinodal. Nesta Sala, estávamos todos juntos. Em seguida, os bispos brasileiros passaram a fazer parte de dois grupos linguísticos. Nós participamos de grupos de língua espanhola e portuguesa. E nesses pequenos grupos, teve início a reflexão que depois evoluiu para a elaboração das proposições que, esta semana, estão sendo unificadas.
Na Aula do Sínodo, os bispos do Brasil fizeram intervenções falando ou enviando as reflexões por escrito?
Todos os padres sinodais tinham o direito de intervir e todos os bispos brasileiros fizeram uso desse direito e apresentaram suas reflexões na assembleia Sinodal. Os superiores Maiores também o fizeram e os chamados auditores, aqueles que estavam lá para ouvir, também fizeram suas intervenções como também os representantes de outras igrejas. Esse foi um momento muito rico não somente porque tivemos a oportunidade de apresentar nossas contribuições do episcopado brasileiro, da Igreja no Brasil, mas também porque nos ajudou a sentir como Igreja, nos levou a sentir a Igreja. Eu estou usando uma expressão muito simples dizendo que cada contribuição foi uma pequena pedra colocada no grande mosaico. No final, nós tínhamos, diante de nós, um mosaico belíssimo com a variedade, a riqueza, a comunhão, as nossas deficiências, os nossos pecados, as apreensões, as contribuições. Esse mosaico simbolizou um grande senso de comunhão da Igreja. Eu diria que foi a expressão da disposição sincera de todos os presentes em assumir sua missão, como Igreja, de evangelizar, de anunciar Jesus crucificado, ressuscitado.
Como tem sido a ordem do dia dos trabalhos do Sínodo e o Santo Padre tem um momento para se dirigir aos membros da assembleia?
A ordem do dia, quando se trata dos encontros na Aula Sinodal, começa sempre as 9hs da manhã, tem intervalo de meia hora e se conclui as 12.30hs. À tarde, recomeça-se as 16.30hs e vai direto até as 19hs. Nos 10 primeiros dias estivemos sempre na Aula e, nos últimos dias, como está sendo hoje, os trabalhos de grupo respeitam o mesmo horário. O Santo Padre teve dois momentos de intervenção dirigida aos sinodais. No momento inicial no qual ele falou da importância do Sínodo e da nova evangelização. Ele já havia se referido ao tema durante a celebração de abertura, mas ele retomou numa fala curta mas bem incisiva animando os padres sinodais a, realmente, refletirem a questão da nova evangelização. No primeiro dia ainda, no final do almoço com todos os participantes, e de maneira informal, o Papa deu uma palavrinha usando uma imagem bonita dizendo que era preciso que todos se colocassem à caminho. Ele disse que o Sínodo quer levar a Igreja a colocar-se à caminho, de estar sempre à caminho porque essa é a sua missão.
Dois documentos sairão do trabalho sinodal: Uma mensagem que os padres sinodais devem votar na próxima sexta-feira, 26 de outubro, e uma nova exortação apostólica pós-sinodal que reúne toda a riqueza do trabalho feito. Qual a importância de cada um desses documentos?
A mensagem é uma palavra dos padres sinodais às nossas igrejas particulares, às nossas comunidades. É uma mensagem normalmente curta - apesar da proposta feita está bastante longa e bonita - que tenta abordar todas as questões abordadas nas intervenções e nas discussões de grupo e, ao mesmo tempo, lembrar as diferenças dos nossos continentes e propondo uma evangelização cheia de vigor e entusiasmo a partir da realidade. A mensagem, portanto, é uma mensagem dos padres sinodais às igrejas particulares, as comunidades. Nós estamos, à esta altura, trabalhando as proposições que foram discutidas nos grupos a partir do plenário. Essas proposições serão apresentadas ao Santo Padre como contribuição para a exortação pós-sinodal sobre a nova evangelização e transmissão da fé. Existem proposições muito importantes que retomam os documentos do Concílio Vaticano II, especialmente as duas constituições dogmáticas, aLumen Gentium e a Gaudium et Spes, que lembram que a Igreja que tem uma missão, a missão de evangelizar e evangelizar é uma ação muito concreta: ir ao encontro da realidade. Outro documento que tem sido muito citado é a exortação pós-sinodal de Paulo VI, a Evangelii Nuntiandi. Este, depois dos documentos do Vaticano II, tem sido quase um texto de referência. E depois também são considerados também os textos do beato João Paulo II e do Papa Bento XVI. Esses documentos têm iluminado as discussões e as proposições que será apresentadas ao Santo Padre e nós estamos esperando da parte do dele, uma exortação muito positiva. Estamos esperando um documento que nos diga o que seja uma nova evangelização, como ela deveria acontecer, envolvendo muito nossas igrejas particulares, as nossas comunidades. Envolvendo todos os ministérios e serviços na Igreja que tem como missão evangelizar, anunciar, portanto, essa presença maravilhosa, estupenda de Deus no meio de nós, em Jesus Cristo. O nosso primeiro anúncio é dizer o quanto Deus nos amou em Jesus Cristo, na sua morte e ressurreição nos libertando do mal em nossa realidade humana. Essa é tarefa de todos os ministros ordenados e dos diversos ministérios dos nossos leigos. Estamos esperando também, porque foi muito mencionado no plenário, que o documento reafirme a importância da família, a importância dos leigos, a importância dos presbíteros, a importância do bispo, a importância de nossas igrejas particulares. Eu creio que o Santo Padre vai nos dar um texto muito bom, assim como nos deu um texto excelente que é a exortação a respeito do último Sínodo, aVerbum Domini, que realmente nos abriu um horizonte novo sobre a Palavra de Deus. Nos levou mais a amar a Palavra de Deus. Nos encorajou a nos deixar tomar pela Palavra de Deus. Certamente o documento pós-sinodal vai nos abrir, de novo, para a missão assim como fez o do documento de Aparecida que nos levou a assumir a consciência de que somos discípulos missionários. Certamente também o texto que o Santo Padre vai nos dar vai nos ajudar a ser uma Igreja que anuncia Jesus Cristo, anuncia o Reino de Deus, mas especialmente uma Igreja que vive do Reino de Deus, vive de Jesus Cristo. E o Espírito Santo que está presente neste Sínodo, certamente, vai nos ajudar a receber esse texto e sermos também essa presença inovadora que o Espírito sempre suscita na vida da Igreja.
Qual é, na opinião do senhor, o reflexo que se pode perceber aqui no Sínodo da caminhada da Igreja na América Latina e Caribe, especialmente representada pelo documento de Aparecida?
O documento de Aparecida, realmente, não foi só citado pelo episcopado latino-americano mas também por irmãos bispos de outras regiões, mas a sensação que tenho é de que a reflexão toda, a tentativa toda de sermos uma Igreja muito atuante, viva, encarnada está também muito presente na África e na Ásia. Então, mesmo não citando o documento de Aparecida, esse mesmo desejo de sermos uma Igreja aberta, que acolhe, dos pobres, que cuida dos migrantes – que foi muito citado -, uma Igreja que está atenta a todas as realidades e que procura envolver todas as comunidades, isso foi aparecendo sempre de novo no plenário vindo de outras igrejas latino-americanas. Para nós, naturalmente, como Igreja da América Latina, o documento de Aparecida é muito importante e diversos irmãos no episcopado procuraram o documento, tanto assim que o presidente da Congregação para os Bispos, o cardeal Marc Oullet, colocou o texto do documento em italiano à disposição de todos os padres sinodais porque houve um interesse bastante grande de diversos irmãos ouvindo falar e mesmo sentindo que existe já a preocupação com uma nova evangelização na reflexão que o episcopado latino-americano tinha começado a fazer e que tinha começado a buscar caminhos, de modo que esse documento poderia ajudar.
No ambiente do Sínodo, o senhor sente que as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora no Brasil estão nos colocando num caminho em sintonia com a Igreja universal?
Eu penso que está muito presente aqui o primeiro capítulo das nossas Diretrizes porque sempre aparece, nas reflexões do plenário, o encontro com Jesus Cristo. O Deus que nos encontrou. O Deus que nos amou. Somos anunciadores desse encontro e desejamos que todos percebam esse encontro e, gratuitamente, comecem a anunciar também esse Deus tão próximo de nós. A nossa preocupação com a realidade no textos das Diretrizes, no segundo capítulo, foi também acentuada nas intervenções dos representantes dos diversos continentes. A realidade europeia está dentro de um contexto, a realidade latino-americana de outro, africana de outro e assim por diante, mas cada episcopado, cada padre sinodal procurou refletir essa dimensão. E todos procuraram sublinhar o tempo que nós vivemos, o que em nosso texto nós chamamos de “mudança de época”. Depois, quanto às nossas urgências, creio que apareceram, principalmente, as quatro primeiras. A primeira, uma Igreja que deseja evangelizar, portanto, ser uma igreja missionária. Depois, a iniciação à vida cristã foi muito acentuada principalmente realçando o papel do catequista, da catequista. A terceira urgência, a importância da Palavra de Deus, também foi considerada, no anúncio e na vivência da comunidade e das famílias. E depois voltou muitas vezes a preocupação em relação a paróquia, mas como rede de comunidades, nem sempre usando essa expressão mas às pequenas comunidades. Essa preocupação com as pequenas comunidades para que elas sejam realmente vivas, vivam a Palavra de Deus e sejam anunciadoras de Jesus Cristo. Creio que essa nossa preocupação como Conferência Episcopal em relação às diretrizes é bem compartilhada com outras conferências episcopais, com outras igrejas particulares.
O senhor vê uma feliz oportunidade na preparação para a próxima assembleia dos bispos do ano que vem que vai tratar da paróquia podendo contar com toda essa reflexão do Sínodo?
Seria tão bom se tivéssemos o documento pós-sinodal, mas, naturalmente, um documento assim é muito bem preparado, muito bem trabalhado, refletido. Se tivermos o texto, tanto melhor, mas dadas as reflexões no plenário e nos grupos em relação a paróquia, posso dizer que podemos olhar com muita muita esperança em relação ao tema que desejamos abordar em nossa próxima assembleia que é “Comunidade de comunidades: nova paróquia”. Essa necessidade da paróquia se abrir, necessidade da paróquia ser acolhedora, ser evangelizadora; todos os ministérios e serviços à disposição de todos como uma Igreja viva, certamente refletiremos em nossa assembleia e aqui está sendo muito refletido. Também a paróquia tendo, cada vez mais, comunidades menores onde as pessoas possam sentir mais proximidade e mais comunidade em suas preocupações, reflexões e celebrações.
O Sínodo está quase terminando, mas o que o senhor já pode dizer o que está levando como marca pessoal de tudo o que está contecendo nesse encontro?
O que eu levo do Sínodo é uma expressão muito forte de colegialidade. A presença do Santo Padre em tantos momentos no plenário. A presença de tantos irmãos manifestando as preocupações e, ao mesmo tempo, as dinâmicas das igrejas particulares. Eu me sinto unido a tantos irmãos e ao Santo Padre e isso aprofunda muito, em mim, o sentido de colegialidade. E, ao mesmo tempo, está sendo aprofundado o sentido de comunhão. Entendendo comunhão não somente entre nós, da Igreja Católica, mas comunhão também no sentido de uma compreensão mais ampla com a presença que o Santo Padre trouxe para o Sínodo dos membros de outras igrejas que também estão falando. Uma presença muito viva e que nos tocou muito foi a do arcebispo de Canterbury e primaz da Comunhão Anglicana, Rowan Williams. A intervenção dele foi muito bonita e tratou da contemplação no mundo de hoje. Está se manifestando esse sentido de uma comunhão maior entre nós, bispos, religiosos, leigos que ali estavam. Essa comunhão profunda que é expressão da vida na Igreja. Nós estamos todos ali participando porque somos Igreja, porque somos todos filhos no Filho. Nós pertencemos à grande família da Trindade. Esses dois aspectos estão me marcando muito e um outro aspecto que está me marcando muito é o clima de familiaridade entre os irmãos bispos. Mesmo não nos entendendo muito com a língua, há muita expressão de gestos querendo abraçar, cumprimentar, o desejo de querer saber da realidade uns dos outros. Eles querendo saber da Igreja no Brasil, na América Latina e nós também querendo saber da Igreja na África, Ásia, Europa e na Austrália. São esses os três pontos que eu vou levar como uma grande recordação do Sínodo.
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